segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Fera nua (Agostinho Fortes)


Ela foge por vãos e labirintos
Mas seu rastro não se desfaz
Vou atrás com meus olhos tão famintos
Com a fome e a fúria dos animais

É afoita, ligeira e arisca
Na mata escura ela se disfarça
Fora de sua toca não se arrisca
Indomável é a sua raça
 
No escuro posso sentir seu cheiro
Me aproximando com punhos fortes
Ela mostra seus dentes e desespero
Ameaça me dar um bote

Num só golpe me puxa e expulsa
Retrai, impulsa e não se cansa
Seu grito doido de aflição e alívio
Prazer rasgando a sua garganta

Já não demonstra medo do seu senhor
Seu corpo se agitando selvagem
Seu suor correndo em minha boca
Quente de medo e coragem

E quando enfim seu corpo se aquieta
Seus olhos miram o infinito
Sua boca esfriando entreaberta
Rosna mansa o seu instinto
 
Domada pelo seu caçador feroz
Fez dele seu amor, presa e algoz
Fera nua, meu bicho do mato
Foge de novo que eu lhe cato

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