quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Buscando as raízes (Agostinho Fortes)


Ele chegou com saudade no peito e dinheiro no bolso
Como prometeu, regressou pra onde vivera até moço
Já tinha asfalto, pouca poeira, iluminação
Custou a reconhecer até o próprio irmão

Aquela linda mulher que sempre o esnobara
Ofereceu-lhe a mão e o corpo logo de cara
O cego da praça que parecia nunca ter visto a luz
Ao ver aquele homem chegando, fez o sinal da cruz

O dono da venda que nunca lhe vendera fiado
Lhe mandou cigarro, uísque sem cobrar um trocado
E de quebra inda lhe mostrou a filha todo sorridente
Parecia expor um produto do qual tinha a patente

O delegado que odiava até ladrão de galinha
Fez vista grossa pro negócio dele que era farinha
Mas era farinha seleta e de cor muito branca
Da Bolívia que vinha e saía pela Zona Franca

O padre que lhe penitenciara por mil sacrilégios
Teve a sua visita na igreja como um privilégio
Ele chegou buscando as raízes e agora partia
Partido pela raiz, murcho de hipocrisia
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário