quinta-feira, 4 de dezembro de 2014
Triste carmesim (Agostinho Fortes)
Eu sem você
Não tenho assunto
Mas sei que ainda
Estamos juntos
No pôr-do-sol
Triste carmesim
Trago as flores
Saudades sem fim
Eu sem você
Vivo a chorar
Dias sem fim
Noites sem luar
Pobre de mim
Que estou a esperar
A paz que, enfim
Virá me buscar
Você se foi
Sem mais, nem porquê
Meus olhos no mar
Aguardam lhe ver
Se a vida conduz
Sempre ao mesmo fim
Espero a luz
Que a levou de mim
segunda-feira, 1 de dezembro de 2014
Luana (Agostinho Fortes)
Vem raio de sol
Vem bronzear meu corpo
Vem dourar os meus cabelos longos
Vem minha Luana
Me abrasa os lábios, cora minha face e ferve meus sentidos
Vem aguçar
A minha nuca, pele, pêlo, boca, seios e ouvidos
Minha Luana, estou tão linda
Vem raio de sol
Me dá a cor de um pecado
Que ninguém perdoa
A cor dos bichos
Que eu fico assim pagã mestiça à flor da pele e ávida de brasa
Minha Luana,
Eu fico aflita a te esperar sozinha nessa imensa casa
Minha Luana, seja bem vinda
Vai minha Luana
Que a cidade toda nos quer ver
Queimando feito bruxas
Foge Luana
Mal sabem eles que se a gente queima, a gente vai com os ventos
As nossas cinzas
Redemoinhos espalhando, derramando os bons momentos
Nossa alegria, nossa paixão tão proibida
Tão ilegal, tão infernal e destemida
Vem bronzear meu corpo
Vem dourar os meus cabelos longos
Vem minha Luana
Me abrasa os lábios, cora minha face e ferve meus sentidos
Vem aguçar
A minha nuca, pele, pêlo, boca, seios e ouvidos
Minha Luana, estou tão linda
Vem raio de sol
Me dá a cor de um pecado
Que ninguém perdoa
A cor dos bichos
Que eu fico assim pagã mestiça à flor da pele e ávida de brasa
Minha Luana,
Eu fico aflita a te esperar sozinha nessa imensa casa
Minha Luana, seja bem vinda
Vai minha Luana
Que a cidade toda nos quer ver
Queimando feito bruxas
Foge Luana
Mal sabem eles que se a gente queima, a gente vai com os ventos
As nossas cinzas
Redemoinhos espalhando, derramando os bons momentos
Nossa alegria, nossa paixão tão proibida
Tão ilegal, tão infernal e destemida
Valiosa prata (Agostinho Fortes)
Ah,
Se minha mão tocasse a lua,
Se você quisesse que ela fosse sua
E ela coubesse na palma da mão
Quando chegasse o momento oportuno
Em que os astros desse céu noturno
Se distraíssem por qualquer razão
Eu furtaria a mais valiosa prata,
Me esconderia no meio da mata
Sob um céu vítima dessa paixão
Ah,
Quando acordei não era dia,
Não foi um sonho a minha covardia
De roubar em nome de um só coração
Arrebatei as noites de luar
Dos namorados, seresteiros,
Poetas e boêmios baderneiros
Pra um belo dia vir a maldição
E então,
O sol que sempre vinha atrás da sua amada
Ao perceber que fora sequestrada,
Nunca mais raiou pra gente não
Ah meu bem,
E se você ainda quiser a lua
Saiba ... que quanto mais longe, mais é sua
E mais perto fica do seu coração
Se você quisesse que ela fosse sua
E ela coubesse na palma da mão
Quando chegasse o momento oportuno
Em que os astros desse céu noturno
Se distraíssem por qualquer razão
Eu furtaria a mais valiosa prata,
Me esconderia no meio da mata
Sob um céu vítima dessa paixão
Ah,
Quando acordei não era dia,
Não foi um sonho a minha covardia
De roubar em nome de um só coração
Arrebatei as noites de luar
Dos namorados, seresteiros,
Poetas e boêmios baderneiros
Pra um belo dia vir a maldição
E então,
O sol que sempre vinha atrás da sua amada
Ao perceber que fora sequestrada,
Nunca mais raiou pra gente não
Ah meu bem,
E se você ainda quiser a lua
Saiba ... que quanto mais longe, mais é sua
E mais perto fica do seu coração
A rosa do carnaval (Agostinho Fortes)
Essa boca mentirosa
Da Rosa, da Rosa
Sempre tão cheia de prosa
Que rosa, que rosa
Diz que eu sou o tal
Único e primeiro
Mas pra não levar a mal
Quando chega fevereiro
É que o carnaval
É a primavera da Rosa
Flagrei sambando no jornal
Seminua, a mentirosa
Chego até a passar mal
Vendo sua maldade na avenida
Distribuindo em poucas horas
Todos os beijos que lhe dei na vida
Essa boca caridosa
Da Rosa, da Rosa
Quarta-feira vem dengosa
Me goza, me goza
Eu choro samba (Agostinho Fortes)
Eu faço samba
Eu choro samba
Só pra me divertir
Meu tamborim que leva a vida
E não deixa a peteca cair
Eu faço samba
Invento um som
Faço de tudo e você não vem
Dizem as más línguas que você gosta de samba
E samba como ninguém
Chora cavaco
Chora a cuíca
Choro eu também
O meu samba há de entrar no seu barraco
E lhe fazer um bem
Eu faço samba
Invento um som
Faço de tudo e você não vem
Dizem as más línguas que você gosta de samba
E samba como ninguém
Só pra me divertir
Meu tamborim que leva a vida
E não deixa a peteca cair
Eu faço samba
Invento um som
Faço de tudo e você não vem
Dizem as más línguas que você gosta de samba
E samba como ninguém
Chora cavaco
Chora a cuíca
Choro eu também
O meu samba há de entrar no seu barraco
E lhe fazer um bem
Eu faço samba
Invento um som
Faço de tudo e você não vem
Dizem as más línguas que você gosta de samba
E samba como ninguém
Doida (Agostinho Fortes)
Doida, dança no meio da pista
Pensa que é capa de revista
Encena, chora como artista
Artista, artista
E sai por aí sozinha na noite
A doida jura que é só minha
Verdade, mas sai por aí sozinha
Idade da filha da minha filha
Humilha, humilha
E sai por aí só minha, sozinha
É franca, mas gosta de fazer fita
Arranca meus olhos quando se irrita
Espanca, dá nó na minha veia
Estanca, estanca
E sai por aí faceira, ligeira
Vadia, na rua esquece o lar
Vampira, levou minha jugular
Revira sem dó as minhas mentiras
Que ira, que ira
E se manda vingativa na noite
Esperta, gosta de uma maré mansa
Perdulária, deu fim à minha herança
Hilária, me comprou uma lembrança
Não cansa, me cansa
E sai por aí fugida, bandida
A doida saiu
por aí faceira
Artista, se
mandou tão vingativa
Vampira, saiu
por aí fugida
Ligeira,
bandida
Mas voltou
arrependida, vadia
A doida
A esperança dos dias (Agostinho Fortes)
Ah, que saudade daí
Ah, como o tempo passou
Conte alguma novidade
Que alivia a saudade
E distrai minha dor
Não, nunca vi nevar tanto
Combinou com o meu pranto
Com as areias da praia
Tudo ficou lindo e branco
E pra lhe ser bem franco
Eu até sorri
Me fez lembrar seu sorriso
Que foi meu maior aviso
Pra nunca sair daí
Ah, saudade dos meninos
Ah, saudade de você
Conte pra toda a cidade
Que eu chego num fim de tarde
Antes de escurecer
Hoje, só pensei em você
Rodei na Champs-Élysées
Com os seus olhos e sonhos
Comprei um perfume bacana
Ainda vai sobrar grana
Pra aquele paetê
Esse frio tá de morte
Que saudade do Norte
Como é duro esperar lhe ver
Trago as economias
E a esperança dos dias
Que um dia fui lhe prometer
Mãe guerra (Agostinho Fortes)
Súbito da guerra fez-se a paz
Ruínas gentis, cheiros de morte
Terrores sutis, calmarias mortais
Silêncios febris, sopro de sorte
Saudades violentas e gritos banais
Súbito da paz fez-se a vida
Amáveis granadas inertes, tímidas fumaças
Angústias caladas e crianças retornam às praças
Mercados agitados, olarias perfumadas
Tijolo por tijolo vou vendo viúvas ouriçadas
Súbito do fim fez-se o início
Estúpido beijo da mãe guerra
Que beija o filho morto
E depois, deserda
Ela se descuidou (Agostinho Fortes)
Ela se descuidou
Não viu que palácios ruíam
Falésias comiam fronteiras
Se deslocando trépidas
Pelo mundo dela
Ela se descuidou
Não viu que seu tempo passava
O jardim que secava e as fogueiras
Que pairavam gélidas
Em torno dela
Ela se acostumou
Sim, com as noites sem sono
Na mesa dos ébrios
Com a vida sem sonho
No alto dos prédios
Seu tempo assim passou
Seu pranto, quebranto, encanto
Beleza e alegria
Ficaram com os homens
De vida vadia
Quem sabe com eles
Foi feliz um dia
Quereria (Agostinho Fortes)
Quereria o teu sorriso sorrir
Quereria o teu choro chorar
Quereria o teu sono dormir
E com o teu sonho na cara, acordar
Acontece que sou tão desigual
Por favor não me leves tão a mal
Quereria correr quando corres
Quando paras, ser o teu paradeiro
Quereria morrer quando morres
Quando nua, beijar teu corpo inteiro
Acontece que sou tão diferente
Não me leves a mal tão de repente
Mas se voas, às vezes rastejo
Quando ventas, sou brisa o ano inteiro
Quando és branca nuvem, relampejo
Onde esbanjas, eu conto dinheiro
Acontece que somos tão iguais
E eu sou mais tu além do mais
Quereria amar-te simplesmente
Sem querer o que queres ou não
Quereria ser louco e demente
Adorar o teu sim e o teu não
Acontece que furtivamente
Colocaste os meus pés no chão
Mundos (Agostinho Fortes)
Parti na madrugada
Com a lua no meu calcanhar
As estrelas sobre meus ombros, amor
Pareciam até duvidar
Andei por tantos mundos
Em busca de outra aurora
Que abrisse meus olhos fundos, amor
Qual raios de outrora
Dormi entre deusas e reis
Troquei pernas nos cabarés
Dancei num céu de estrelas, amor
Brilhei da cabeça aos pés
Ao me verem assim confuso
Demônios debaixo do mar
Anjos de todas as nuvens, amor
Quiseram minha alma levar
Querida, dá-me um sorriso
Preciso te amar já
Deixei o meu coração no teu peito
E agora eu vim buscar
Querida lua (Agostinho Fortes)
Lua, querida lua
Por vezes me falam de ti, assim, com seriedadeDa prata pura
Do astronauta que te pratica em treinamento
Dos calendários, telescópios, marés e seus movimentos
Da tua massa, circunferência e de teus elementos
Querida lua, verdade nua
Lua, querida lua
Outras vezes me falam de ti, assim, com poesiaDa tua cura
Dos que te miram em sofrimento, profecia e magia
De como flutuas na memória flácida de quem já amou um dia
Da cara incrédula e pálida de quem já te viu sombria
Querida lua, bijuteria
Lua, querida lua
Mas eu, como um bom poeta vagabundo, te exageroQuerida lua
Te prometo às donzelas, dou mil tons à tua luz
Só pra te por numa canção que compus
Pra um amor qualquer que finjo amar e não faz juz
A ti, querida lua, lua querida
Fera nua (Agostinho Fortes)
Ela foge por vãos e labirintos
Mas seu rastro não se desfaz
Vou atrás com meus olhos tão famintos
Com a fome e a fúria dos animais
Fora de sua toca não se arrisca
Indomável é a sua raça
Ela mostra seus dentes e desespero
Ameaça me dar um bote
Prazer rasgando a sua garganta
Seu suor correndo em minha boca
Quente de medo e coragem
E quando enfim seu corpo se aquieta
Seus olhos miram o infinito
Sua boca esfriando entreaberta
Rosna mansa o seu instinto
Vou atrás com meus olhos tão famintos
Com a fome e a fúria dos animais
É afoita, ligeira e arisca
Na mata escura ela se disfarçaFora de sua toca não se arrisca
Indomável é a sua raça
No escuro posso sentir seu cheiro
Me aproximando com punhos fortesEla mostra seus dentes e desespero
Ameaça me dar um bote
Num só golpe me puxa e expulsa
Retrai, impulsa e não se cansa
Seu grito doido de aflição e alívioPrazer rasgando a sua garganta
Já não demonstra medo do seu senhor
Seu corpo se agitando selvagemSeu suor correndo em minha boca
Quente de medo e coragem
E quando enfim seu corpo se aquieta
Seus olhos miram o infinito
Sua boca esfriando entreaberta
Rosna mansa o seu instinto
Domada pelo seu caçador feroz
Fez dele seu amor, presa e algoz
Fera nua, meu bicho do mato
Foge de novo que eu lhe cato
Ode ao Rio (Agostinho Fortes)
Andar por todo esse Rio e ver
As cores de um mar sem fim
Gaivotas tresloucadas
Perfuram feito espadas
O azul do mar que sangra em mim
Andar por esse Rio e não perder
Meu olhar bobo de turista
Vendo as praias e os mares
A vida sentada nos bares
Na orla me perder de vista
Orar e xingar na catedral do gol
Fla-Flu faz a terra tremer
Vi meu sonho na Sapucaí
Da Pedra da Gávea eu caí
Na Lapa vai amanhecer
Trocar de catedral embriagado
Ver em cores a Sapucaí
Gaivotas no fla-flu
Espadas a cair
No mar que sangra azul
Turistas por aí
A Lapa vai tremer
Um gol pra divertir
Na orla amanhecer
O Rio que é aqui
Sobre a Gávea então voar
Voar até cair
Os bares na tv
Acho que já vou dormir
Ladrão poeta (Agostinho Fortes)
Eu sou mesmo um bom ladrão que ama
E que rouba dos poetas
Suas mentiras, os seus versos e paixões
E dos infelizes, fantasias
Poesias de ilusões
Roubo de outras vozes melodias
Estribilhos e emoções
E assim faço minhas, sempre minhas
As minhas próprias canções
E as notas dos instrumentistas
Borboletas suicidas
Caem assim nas minhas mãos
Mortas na canção
E faço uma canção
Eu sou mesmo um bom ladrão que ama
Quem me dera eu roubasse
Bem assim teu coração
Me dá o teu perdão
Que faço outra canção
Eu sou mesmo um ladrão fajuto
E que pra roubar teus olhos
Faço cena de um filme que gostei
Eu sou mesmo um poeta que ama
E pra sempre te amarei
E que rouba dos poetas
Suas mentiras, os seus versos e paixões
E dos infelizes, fantasias
Poesias de ilusões
Roubo de outras vozes melodias
Estribilhos e emoções
E assim faço minhas, sempre minhas
As minhas próprias canções
E as notas dos instrumentistas
Borboletas suicidas
Caem assim nas minhas mãos
Mortas na canção
E faço uma canção
Eu sou mesmo um bom ladrão que ama
Quem me dera eu roubasse
Bem assim teu coração
Me dá o teu perdão
Que faço outra canção
Eu sou mesmo um ladrão fajuto
E que pra roubar teus olhos
Faço cena de um filme que gostei
Eu sou mesmo um poeta que ama
E pra sempre te amarei
Ode ao Rio - versão 2 (Agostinho Fortes)
Ando no Rio
Respiro as praias, as saias e os mares
Vejo a vida sentada nos bares
Feliz
Subo ao Cristo
É como se jamais tivesse visto
Meu olhar de turista a pasmar
Feliz
Ando no Rio
Bebo o Cristo, as saias e os mares
Meu olhar confundindo nos bares
Paris
Respiro as praias, as saias e os mares
Vejo a vida sentada nos bares
Feliz
Subo ao Cristo
É como se jamais tivesse visto
Meu olhar de turista a pasmar
Feliz
Ando no Rio
Bebo o Cristo, as saias e os mares
Meu olhar confundindo nos bares
Paris
Iara (Agostinho Fortes)
Foi um
quebranto, mandinga ou encanto
Que me acometeuEu na beira do rio e ela sorriu
Era só ela e eu
Deu-me a boca,
beijou-me louca
E desapareceuPassei a ver e só eu que via
Gente que já morreu
Vi criaturas,
fogo nas alturas
Ao lado de um
serafimJurupari entrou no meu sonho
E o sonho não tinha fim
Vi Iara espalhando seu mais lindo canto
Seu chamado sedutor
Vi, em seus braços, pobre e feliz
Um jovem pescador
Naquelas águas, na calmaria
Vi morte e amor
Mula sem cabeça, antes que eu me esqueça
E a Cuca me pegou
Matita Perê,
sei, ninguém vai crer
Mas ouvi
assobiarNuma rajada de vento na cara
Saci sabe assustar
Sumiu meu fumo,
sumiu a pinga
Até mesmo o meu
alentoVi as pegadas de Curupira
Sumindo mata adentro
Boitatá me
cegou, nem vi, me queimou
E o boto rosa a
dançarDeixou as raparigas cheias de barriga
Roubou até o meu par
Mas certa noite
a lua veio
Pra tudo alumiarDe tal maneira que toda a cidade
Enfim se pôs a cantar
Sumiram
fantasmas, voaram as bruxas
Comeram-se os
canibaisNão sei explicar, mas tais criaturas
Nem eram meus rivais
Foi assim que
perdi a velha mania
De nunca, jamais
crerNo que claramente, bem claramente
Meus olhos não podem ver
Então vi mais
fundo, vi mais o mundo
Mais lindo e
muito maisVi o amor, seu cheiro e cor
Enfim minha fé em paz
Bendita
mandinga, bendito quebranto
Que me acometeuBendita Iara, seu beijo e canto
Bendito seja Deus
Artista do sinal (Agostinho Fortes)
Mora no Vidigal
Ensaia um mortal
Faz mil malabarismos
Artista do sinal
Brinca no asfalto
Com a bola, dá caneta
Encena um assalto
E arrebata uma preta
Se hospeda em Bangu sem querer
Não larga o celular, quer vender
Inventa um motim e organiza a nação
Foge da polícia
Já tem até família
O barraco tá pequeno
A nega é uma delícia
Serve no Vidigal
Vai buscar um papel
Sentinela ligado
Vigiando o quartel
Se hospeda em Bangu sem querer
Não larga o celular, quer vender
Inventa um motim e organiza a nação
Se hospeda no Cajú sem querer
O luto vai passar na tv
O morro chora assim, sem consolação
Ali defronte (Agostinho Fortes)
No rio ali defronte
Toda a correnteza corria
Todos os peixes havia
No rio ali defronte
E o velho, cá do alto do monte
Na sua cadeira de balanço que rangia
Com seus olhos marejados de vigia
Admirava o rio ali defronte
Lá, toda rede se lançava
Todo parto se fazia
Toda sede se matava
Batizados, noite e dia
E o velho via cá do monte
Toda moça que se banhava
Também a roupa que se lavava
Naquele rio ali defronte
Um dia, o velho do alto do monte
Não mais veio à sua varanda
E ninguém sabe por onde anda
O vigia, que vivia ali defronte
E, então, o rio secou
Reza a lenda que as lágrimas do velho
Eram do rio a fonte
Aquele rio que não tinha margens
Muito menos ponte
Um rio que vinha não sei de onde
E que só no sonho do velho existia
Pois nem eu, nem ninguém sabia
Que aquele rio ali defronte
Era o rio das saudades
Das saudades de uma vida
Que vivia lá no monte
sexta-feira, 14 de novembro de 2014
Quando eu toco (Agostinho Fortes)
Quando eu toco, arrebento
As cordas do violão
Quando eu choro, eu inundo
Quase todo o sertão
Quando durmo, só acordo
No final do verão
Quando eu bebo, eu me afogo
Ressurjo na embarcação
Quando eu beijo, eu aspiro
O som do teu coração
Quando eu calo, nem suspiro
Se ouve na escuridão
Quando eu amo, eu me caso
E rasgo meu coração
Quando odeio, estilhaço
Rezo e peço perdão
Quando eu brigo, sai de baixo
Quem não for meu irmão
Quando eu canso, eu disfarço
E canto outra canção
As cordas do violão
Quando eu choro, eu inundo
Quase todo o sertão
Quando durmo, só acordo
No final do verão
Quando eu bebo, eu me afogo
Ressurjo na embarcação
Quando eu beijo, eu aspiro
O som do teu coração
Quando eu calo, nem suspiro
Se ouve na escuridão
Quando eu amo, eu me caso
E rasgo meu coração
Quando odeio, estilhaço
Rezo e peço perdão
Quando eu brigo, sai de baixo
Quem não for meu irmão
Quando eu canso, eu disfarço
E canto outra canção
quinta-feira, 13 de novembro de 2014
Ciumenta demais (Agostinho Fortes)
Ciumenta demais
É capaz de por fogo em toda a cidade
Só pra ver queimar supostas amantes
E a gente fugir feito dois retirantes
Delira demais
É capaz de me ver onde nunca estive
Atrás dos cenários, amando as atrizes
Amando mundo afora e esquecendo países
Imagina rapaz
Se o que ela imagina fosse verdade
Eu entre sereias sobre conchas e seixos
Descobrindo as Índias, escambando beijos
Mas ela não sabe
É que só tenho um desejo de amá-la demais
Além do que vejo, além das atrizes
Apesar do mundo e de todo cenário
Além das sereias e além dos países
Além dos infelizes e do imaginário
Além do além e além e além ...
Era ela (Agostinho Fortes)
Era ela na tela
Não sei
Acho que ninguém viu
Fui eu que sonhei
Mas ela sumiu
Mais uma vez
Não conheço sua voz
Mas gostei
Um papo que não se ouviu
Será que só eu que falei
Ou ela sumiu
Outra vez ?
Ela está longe
Eu bem sei
Mas por essa janela
Arremesso meus olhos nos dela
Será que ela esquiva ?
Talvez
E quando toquei o seu rosto
Ele se desfez
Não sei
Acho que ninguém viu
Fui eu que sonhei
Mas ela sumiu
Mais uma vez
Não conheço sua voz
Mas gostei
Um papo que não se ouviu
Será que só eu que falei
Ou ela sumiu
Outra vez ?
Ela está longe
Eu bem sei
Mas por essa janela
Arremesso meus olhos nos dela
Será que ela esquiva ?
Talvez
E quando toquei o seu rosto
Ele se desfez
Entre meus dedos
Então escorreu
E num chão de nuvens
Perdi sua tez
Será que foi alguém ?
Será que foi aqui ?
Ou será muito além ?
Será que foi um trem ?
Só sei lhe dizer
Que o que ela me fez
Me fez tão bem
E num chão de nuvens
Perdi sua tez
Será que foi alguém ?
Será que foi aqui ?
Ou será muito além ?
Será que foi um trem ?
Só sei lhe dizer
Que o que ela me fez
Me fez tão bem
quarta-feira, 12 de novembro de 2014
Nos perdemos (Agostinho Fortes)
Tem mais rio no sertão
Que amor no seu coração
Tem mais sol em Moscou
Que nas suas mãos
Tem mais vida lá fora
Que aqui dentro de nós
Meu amor, vou embora
Que amor no seu coração
Tem mais sol em Moscou
Que nas suas mãos
Tem mais vida lá fora
Que aqui dentro de nós
Meu amor, vou embora
Vou soltar minha voz
Nosso laço afrouxou
Apertaram-se os nós
Meu amor, onde foi
Que nos perdemos de nós ?
Em Veneza, Toronto
Em Paris ou Berlim
Será que foi em você
Ou foi dentro de mim ?
Bom velhinho (Agostinho Fortes)
A vida toda
Ele não se entregou a ninguém
Nunca soube do espinho da flor
Só dos frutos do amor
Que no sonho ele tem
Nunca arriscou
Brincar com fogo
Tampouco desrespeitou
As regras do jogo
Não correu o mundo
Seu mundo parou
Nem mergulhou fundo
Só respirou
A vida toda
Ele não se rendeu a ninguém
Nunca soube do punhal no peito
Só do amor perfeito
Que no sonho ele tem
Sempre guardou
O seu coração
Por medo, vergonha
Ou precaução
Por nenhuma dama
Ele adoeceu
Se ficou de cama
Foi que o time perdeu
Ao fim da vida
Lamenta que pouco se deu
No derradeiro olhar, mira a flor
Para cravar o espinho
Mas já não sente a dor
O velho foi sozinho
Sem carinho e flor
Sem punhal, sem espinho
Sem fogo, sem amor
Lá vai o bom velhinho
Sem carinho e flor
A bailarina (Agostinho Fortes)
A bailarina, que linda
Soberana, estonteante
Passeia no palco
Mil luzes a cada instante
Passeia e leva os olhos
Dos olhos leva o choro
Com o choro, lava o palco
E nasce um palco de ouro
Um salto que marca a retina
E espeta o peito de quem se fascina
Até que os aplausos exaustos
Acordem do sonho quem já se alucina
E o tombo sutil da majestosa cortina
Leve embora a nossa ilusão bailarina
Buscando as raízes (Agostinho Fortes)
Ele chegou com saudade no peito e dinheiro no bolso
Como prometeu, regressou pra onde vivera até moço
Já tinha asfalto, pouca poeira, iluminação
Custou a reconhecer até o próprio irmão
Aquela linda mulher que sempre o esnobara
Ofereceu-lhe a mão e o corpo logo de cara
O cego da praça que parecia nunca ter visto a luz
Ao ver aquele homem chegando, fez o sinal da cruz
O dono da venda que nunca lhe vendera fiado
Lhe mandou cigarro, uísque sem cobrar um trocado
E de quebra inda lhe mostrou a filha todo sorridente
Parecia expor um produto do qual tinha a patente
O delegado que odiava até ladrão de galinha
Fez vista grossa pro negócio dele que era farinha
Mas era farinha seleta e de cor muito branca
Da Bolívia que vinha e saía pela Zona Franca
O padre que lhe penitenciara por mil sacrilégios
Teve a sua visita na igreja como um privilégio
Ele chegou buscando as raízes e agora partia
Partido pela raiz, murcho de hipocrisia
terça-feira, 11 de novembro de 2014
Tem coisa pra me acontecer (Agostinho Fortes)
Perdi meu carro, o cigarro, a mulher
E um pigarro a me aborrecer
Será que inda tem coisa pra me acontecer ?
To me mudando pra um ap apertado, alugado
Esquina da Duvivier
Será que inda tem coisa pra me acontecer ?
To meditando, rezando, prometendo
Nem sei bem mais o que
Será que inda tem coisa pra me acontecer ?
Fui pegar alguns trapos na casa da ex
E meu cachorro tentou me morder
Isso jamais pensei que fosse acontecer !
Quando cheguei hoje cedo ao trabalho
O chefe disse: foi bom te conhecer
Será que inda tem coisa pra me acontecer ?
Da ponte Rio-Niterói
Dar um pulo que é bonito de ver
Qualquer dia vocês vão me ver na tv
Se mamãe ou alguém peguntar onde está
Vocês podem dizer
Foi dar um mergulho pra se refazer
E se querem saber se algum dia, uma noite
Vocês ainda vão me ver
Aqui no fundo do mar só vendo pra crer
Joana do mar (Agostinho Fortes)
Lembrei-me de Joana
Que lembrou a brisa
Que lembrou a praia
Que lembrou o mar
Que lembrou a vida
Boa de levar
Lembrei-me de Joana
Que lembrou suplício
Que lembrou naufrágios
Que lembrou o mar
Que lembrou a vida
Boa de chorar
Não fala de Joana
Que lembra João
Que me levou Joana
Pra nunca mais voltar
Pra esquecer Joana
Lembrei-me de Maria
Que até outro dia
Só fazia me amar
Mas até Maria
Me lembra Joana
Que João deixou
Pra nunca mais voltar
Súbito esqueci
E quem há de lembrar ?
Que lembrou a brisa
Que lembrou a praia
Que lembrou o mar
Que lembrou a vida
Boa de levar
Lembrei-me de Joana
Que lembrou suplício
Que lembrou naufrágios
Que lembrou o mar
Que lembrou a vida
Boa de chorar
Não fala de Joana
Que lembra João
Que me levou Joana
Pra nunca mais voltar
Pra esquecer Joana
Lembrei-me de Maria
Que até outro dia
Só fazia me amar
Mas até Maria
Me lembra Joana
Que João deixou
Pra nunca mais voltar
Súbito esqueci
E quem há de lembrar ?
segunda-feira, 10 de novembro de 2014
Sonhei (Agostinho Fortes)
Sonhei que o gringo sambava
Sonhei que o gato latia
De tanto sonhar besteiras
Ai, jamais acordaria
Esbravejavam à margem
Independência ou morte
Eu seminua na moita
Esbravejava mais forte
Olha que sorte
Vi chovendo pra cima
E o mar correndo pro rio
E por sonhar ao contrário
Me deu calor sentir frio
Numa sinfonia muda
Com violinos sem corda
Alguém da plateia surda
Me disse, amor
Vê se acorda
Sonhei um belo banquete
Suas vadias servindo
Suas entranhas na mesa
Eu devorando e rindo
Suas entranhas na mesa
Eu devorando e rindo
Sonhei que meu casamento
Seguia de vento em popa
E acordei com você
Ai, me lembrando de passar roupa
Delicada (Agostinho Fortes)
Ela chegou tão delicada
E de forma cativante
Talvez por ser em vida
aterrorizante
Ela chegou altiva e acenava
Como se fosse esperada
Talvez por ser em vida tão
ignorada
Ela chegou como um acalanto
E o fez adormecer
Não lhe causou espanto
Nem o fez sofrer
Lhe pôs as mãos nos ombros e
lhe disse em voz contida
Dá aqui a tua mão que estamos
de partida
A carne enferma não te serve
mais de moradia
Eis enfim a paz que em vida
nunca encontrarias
Eis enfim as honras póstumas
que em vida merecias
Eis enfim o frenesi dos
vermes em orgia
Não faça não (Agostinho Fortes)
Meu bem, meu bem
Por favor
Um pouco menos da sua atenção
Meu amor, qualquer favor
Não faça não
Meu bem
Pra que flores todos os dias ?
Não sabe que se a gente vive entre as flores
E com o corpo perfumado de jasmim
Vai ao deserto por saber que lá não há jardim ?
Meu bem
Pra que tanta educação ?
O seu silêncio atrapalha a confusão
O seu incêndio mal assusta um barracão
E sua conversa é mais reta que um sermão
Meu bem
Pra que tantas ligações ?
Pra que mais de um bom dia todo dia ?
Pra que meu nome em todas as suas orações ?
E esses carinhos que nem deixam arranhões ?
Ai, meu bem
Tanta alegria, que me dá azia
Seu amor incondicional me faz vazia
E ser assim tão pontual em cada encontro
Faz de cada hora e minuto um confronto
Meu bem, ai meu bem
Cuide sem cuidar
Faz como a chuva faz com a flor
E o mar, com o pescador
Que é pra que um dia eu lhe tenha amor
Meu bem, meu bem
Por favor
Um pouco menos da sua atenção
Meu amor, qualquer favor
Faça não
Acabou (Agostinho Fortes)
Hoje não quero caminhar
Nem ver os amigos
Pois se vou falar
Só maltrato os ouvidos
Chicoteio o mundo com esse sofrer
Hoje vou dar as costas pro mar
Vou fechar as cortinas
Vou dormir e rezar
Preces tão repentinas
Pra nunca mais ter que amanhecer
Acabou o amor e a alegria
Foi bom, mas me arrasou
Será que ainda vou amar alguém ?
Esse amor que é meu e me agonia
Nasce e morre sem guardar rancor
Será que amanhã será hoje também ?
Acabou o amor e a alegria
Foi ruim, mas me agradou
Em outro amor, me vingo do meu bem
Esse amor que é meu e me alivia
Se perpetua seja em quem for
Amanhã esse amor estará em alguém
Leblon (Agostinho Fortes)
Recordo de um tempo
Sol morno na praia
O beijo, o Leblon
O vento, a saia
Mas como era bom
Todo dia aquele nosso amor
As nossas risadas
E as caras de pavor
Será que te ligo
Ou te espero na esquina
Será que ainda
És minha menina
Ou será que és
Uma mulher muito feliz
Ao lado de alguém
Que fez o que eu não fiz
A noite me chega
Me dura um ano
Ainda bem cedo
Acordo insano
Arrisco uma carta
E já me vejo um perdedor
Será que estás farta
De palavras de amor
Só quero que saibas
Que foste meu plano e trama
Hoje sou avidez
Nos leitos das damas
Quem sabe em um deles
Te encontro afoita e doida de calor
Quem sabe faremos
As pazes sem pudor
sexta-feira, 7 de novembro de 2014
Coisa da tua solidão (Agostinho Fortes)
Brinca, se arruma, delira
Em seu guarda-roupa, qualquer fantasia
Gira querendo perder o sentido
A cada giro um outro vestido
Ela se odeia, se ama, se encanta
Repassa o batom no tom mais vermelho
Até que seus lábios só queiram beijar
Sua boca impressa por todo o espelho
Encharca-se com o melhor perfume
Estilhaça a janela pra não sufocar
Despertando nas rosas, ciúme
No beija-flor, a vontade de entrar
Prova todos os pares freneticamente
Até que um passo se mostre perfeito
Lança-se travessa pela escadaria
E se despeja nua na noite mais fria
A rua te espera
Deserta, impiedosa
E aquele alguém que ontem te fez mulher
Hoje nem sequer
Uma ligação
Pode esquecer e sofrer
Que foi tudo coisa da tua solidão
Mangue (Agostinho Fortes)
Sangue, tanto sangue
Como a lama do mangue
Me toquei e era sangue
Tive medo de ver
O caranguejo do mangue
Assustei, pensei que fosse um corte
O prelúdio da morte
Mas era algo mais forte
Era arte
Um véu escarlate
Cobrindo-me a parte
Desfiando até o chão
Era eu com medo de mim
Era eu em erupção
Era eu que nascia
Em forma de amor
E agora podia acolher
O milagre da vida
Em meu interior
Depois daquele dia
Todo mês mancharia
Já me chamo mulher
Qualquer dia dou cria
quinta-feira, 6 de novembro de 2014
Não tem perdão (Agostinho Fortes)
Ela amou nos palácios, nos barracos, nos vãos
Ela lavou seus pecados e homens com as próprias mãos
Ela amou teu vizinho, amiga, pai e irmão
E arruinou-se nas camas, deleitou-se nos chãos
Não tem perdão
Ela bebeu as noites, cambaleou nas sacadas
Ela morreu, renasceu, seu vulto pelas escadas
Muitas caronas e filhos inesperados na estrada
Muitos vestidos cafonas, esmerados, pelada
Não tem nada
E eu que já blasfemei, hoje aclamei minha santa
É boa dona de casa, melhor ainda de cama
Mudar de vida e partir, eu sou sua salvação
Ou quer só morrer de rir, ela é minha perdição
Não tem perdão
Agora como no prato que um dia cuspi
Agora beijo as feridas que eu mesmo feri
Não falo mal do inferno, nem das meninas dali
Domingo, igreja, terno e missa pra nos remir
Deus perdoe
quarta-feira, 5 de novembro de 2014
Mundo moribundo (Agostinho Fortes)
Vão devastar Bagdá
Dizem ter bomba por lá
Vão fuxicar a mesquita
Chamar de gente esquisita
Genética muda o que pode
A ética é muda e sacode
A soja tá tão diferente
Já querem clone de gente
Vai acabar moribundo
Num relutar derradeiro
Vai acabar sujo imundo
Vai se acabar, mundo inteiro
Vai se sujar, vai se estrepar
Nunca vi arara azul
Chegou tornado no Sul
Em Angra fizeram usina
Sem represar, coisa fina
Um bêbado profetizou
Cachaça vai acabar
Desgraça pra quem ficar
Água pra quem bem pagar
Vai acabar moribundo
Num relutar derradeiro
Vai acabar sujo imundo
Vai se acabar, mundo inteiro
Vai se sujar, vai se estrepar
Dizem ter bomba por lá
Vão fuxicar a mesquita
Chamar de gente esquisita
Genética muda o que pode
A ética é muda e sacode
A soja tá tão diferente
Já querem clone de gente
Num relutar derradeiro
Vai acabar sujo imundo
Vai se acabar, mundo inteiro
Vai se sujar, vai se estrepar
Nunca vi arara azul
Chegou tornado no Sul
Em Angra fizeram usina
Sem represar, coisa fina
Um bêbado profetizou
Cachaça vai acabar
Desgraça pra quem ficar
Água pra quem bem pagar
Vai acabar moribundo
Num relutar derradeiro
Vai acabar sujo imundo
Vai se acabar, mundo inteiro
Vai se sujar, vai se estrepar
domingo, 2 de novembro de 2014
O samba dá (Agostinho Fortes)
A gente não cansa da luta
A gente só faz lutar
Lá de longe se escuta
Que as coisas vão melhorar
A gente faz samba e careta
Pra toda a mutreta que há
A gente só quer respeito
Que o resto o samba nos dá
A gente faz samba e serão
Não deixa o barco virar
No mar da desilusão
Quem samba sabe nadar
sábado, 1 de novembro de 2014
A tua companhia (Agostinho Fortes)
Pra me curar de uma orgia
Da bebedeira, do carnaval
E me despir da fantasia
De qualquer mal
Me basta a tua companhia
A tua simples companhia
Pra expulsar essa vadia
Que vagueia na minha cuca
Pra amordaçar minha agonia
Exorcizar a minha culpa
Me basta a tua companhia
A tua simples companhia
Pra me retalhar em mil pecados
Fazer brigar os meus dois lados
E ver jorrar pra todo lado
O que corre em minhas veias camuflado
Basta a tua companhia
O teu abraço, o meu regaço
Bastaria
Falsas palavras (Agostinho Fortes)
Sou das palavras
Falsas palavras
Palavras ao vento
De areia, de nuvens
Sou da boca pra fora
Palavras por dentro
Sei que gostas das palavras que te sirvo
Feitas da madrugada, dos dentes rangendo
Palavras órfãs ecoando, dialeto dos corpos
Palavras de pele nas línguas tremendo
Sou das palavras
Que não são minhas
Que arrebatam suspiros
Rondando ouvidos
Só pra ver teu ciúme
Só pra ser teu bandido
Bem sei que gostas das palavras com dor
Que do triste fazem o belo e pintam a cor
Palavra encharcada, palavras falsas
Boiando em teus olhos assim como balsas
Sou das palavras
E elas são minhas
Minha afiada língua
Sou sem palavra
Da conversa fiada
Das coisas banais e lindas
Aprendo palavras difíceis e raras
Depois as esqueço nas tuas coisas
Nos teus pensamentos e na tua voz
Pra a qualquer momento, lembrares de nós
Depois as esqueço nas tuas coisas
Nos teus pensamentos e na tua voz
Pra a qualquer momento, lembrares de nós
Olha aí (Agostinho Fortes)
Olha aí
Lembro da atiradeira certeira
Fazendo alvoroço no matagal
Da bola encrenqueira, festeira
Levando vidraças qual um vendaval
Da manga, da pitanga
Degustadas no quintal
Do doce da vida na boca
E a boca da vida seria fatal
Olha aí, olha aí
Olha aí, que o tempo voa e não volta não
Olha aí, presta atenção
Olha aí, acerta os ponteiros do teu coração
Que já é hora de verão
Lembro do medo de escuro
Do pulo do muro, da cara no chão
Do primeiro beijo molhado
Da primeira saia cobrindo-me a mão
Do primeiro carro
Da primeira contramão
Da primeira moça bonita
Que tirou um tasco do meu coração
Olha aí, olha aí
Olha aí a cor, o cheiro e a flor da estação
Olha aí, presta atenção
Eu às vezes tenho a estranha e leve impressão
De já ter visto este verão
Lembro da atiradeira certeira
Fazendo alvoroço no matagal
Da bola encrenqueira, festeira
Levando vidraças qual um vendaval
Da manga, da pitanga
Degustadas no quintal
Do doce da vida na boca
E a boca da vida seria fatal
Olha aí, olha aí
Olha aí, que o tempo voa e não volta não
Olha aí, presta atenção
Olha aí, acerta os ponteiros do teu coração
Que já é hora de verão
Lembro do medo de escuro
Do pulo do muro, da cara no chão
Do primeiro beijo molhado
Da primeira saia cobrindo-me a mão
Do primeiro carro
Da primeira contramão
Da primeira moça bonita
Que tirou um tasco do meu coração
Olha aí, olha aí
Olha aí a cor, o cheiro e a flor da estação
Olha aí, presta atenção
Eu às vezes tenho a estranha e leve impressão
De já ter visto este verão
Vai Brasil (Agostinho Fortes)
Vai meu Brasil
Leva teus sons e teus tons geniais Mostra teus tambores, tuas cores
Faz o mundo sambar
Meu Brasil de verdes mil
Leva teu calor além mar Mostra a tua mata e não deixa matar
Leva a natureza ao altar
Vai sem pudor
Leva em nuvens as mais
belas morenasE larga a chuva proibida da volúpia
Sobre as terras mais inférteis e serenas
Cuida de teus rios
Deixa que cheguem ao mar Deixa o cheiro da tua terra espalhar
E assim, toda a paz que levares ao mundo
A ti voltará
Madame vai me trazer confusão (Agostinho Fortes)
Pois é
Eu vou te contar
Conheci a madame lá no bar
Ela chegou cheia de prosa
Me abriu um sorriso e se fez de rosa
Espera, cautela
Não vai na dela, meu irmão
Madame vai te trazer confusão
Até
Tem mais pra contarEla me levou a uma ópera
Tanta gente gritando e tanta discórdia
Não tinha pandeiro, só gente sóbria
Loucura, me cura
Ninguém atura, meu irmão Madame vai me trazer confusão
Pois é
Depois no jantar
Era tanto talher, tanto caviar
Eu queria cerveja, traz a calabresa
Deixa só uma colher sobre essa mesa
Loucura, me cura
Ninguém atura, meu irmão Madame vai me trazer confusão
Mané
Depois já no lar Ela disse que iria me mostrar
Perdeu a pose, foi-se a nobreza
Me jogou na cama sem delicadeza
Segura, maluca
Agora não tem volta não Madame já me trouxe confusão
Sem você (Agostinho Fortes)
Sem você
Como serei eu sem você ?
Ah, isso eu não sei dizer
Sei que não vai ser fácil
Não vai ser dócil o viver
E mesmo que eu me junte a um novo amor
Como poderemos nos amar
Sem uma vida pra recordar ?
Não veremos um passado
Não teremos um retrato
Nem algum rastro deixado
Por aí
E quando eu quiser rever as fotografias
E minhas mãos caírem frias
Que outras mãos virão me acalorar ?
Vou ter que aprender a viver a vida
Como se ela fosse uma volta sem ida
Eu voltando de nenhum lugar
Vamos atrás do bloco (Agostinho Fortes)
O mundo em pé de guerra
E uma bomba perdida pode cair aqui
Vamos atrás do bloco
Cantar e beber até cair
Vamos nos beijar
Nos lamber
Nos roçar
E morrer de rir
Minha casa hoje é a avenida
Esquece da vida
E vamos seguir
O Talibã, amanhã
Pode não se convencer e nos explodir
Então brindemos a paz
O amor e o aumento que não vai sair
Hoje tu és salafrária
És ninguém
Ordinária
Esquece de existir
Chuta o teu sofrimento
Outro pé no tormento
Que o bloco tá aí
Lá vem o poeta (Agostinho Fortes)
Horizonte almejado
Quando não alcançado
Adormece sob o pranto
De nuvens escuras e ventos tiranos
Por isso deixem soltas as feras
Entre utopias, quimeras
Deixem nascer a idéia
Sem regras, nem métrica
Deixem-na simplesmente eclética
Um dia foi barro molhado
Hoje, escultura querendo falar
E não é o fim em corpo concreto
E sim um começo, sem forma nem teto
Pois o poeta já tem outra meta
Saiam da frente, saiam da reta
Saiam da frente, lá vem o poeta
Natal (Agostinho Fortes)
Mas que noite bonita !
A casa toda enfeitada
Quase ninguém acredita
Família toda abraçada
A molecada brincando
Na mesa é tanta comida
Tem gente até se esbaldando
Outros lamentando a vida
Hoje cada criança
Dormirá sem vontade
Pra ver debaixo da cama
Amanhecer novidade
Será que toda gente
Espera o mesmo velhinho ?
Alguns esperam fortuna
Outros preferem carinho
Mais um dia (Agostinho Fortes)
O que eu falo já não lhe desatina
Quero ver a cor que tinha o seu coração
O que eu lhe canto, hoje, desafina
Quero ouvir o som que tinha o meu violão
Não quero mais cair na rotina
Ai que medo que eu tenho desse baião
Prefiro você ave de rapina
Voando baixo num rock no salão
Prefiro você bem menina
Sapeca e com má intenção
E se você apronta na surdina
Nem imagina como isso é bom
Mais um dia
O mesmo trânsito, outros carros
Um café, outros cigarros
E o seu beijo vem vão
Mais um dia
E traz o tempo de uma vida
E a vida dura o tempo
Que dura um coração
Quero ver a cor que tinha o seu coração
O que eu lhe canto, hoje, desafina
Quero ouvir o som que tinha o meu violão
Não quero mais cair na rotina
Ai que medo que eu tenho desse baião
Prefiro você ave de rapina
Voando baixo num rock no salão
Prefiro você bem menina
Sapeca e com má intenção
E se você apronta na surdina
Nem imagina como isso é bom
Mais um dia
O mesmo trânsito, outros carros
Um café, outros cigarros
E o seu beijo vem vão
Mais um dia
E traz o tempo de uma vida
E a vida dura o tempo
Que dura um coração
Falar de amor (Agostinho Fortes)
Não me queira ver falar de amor
Não seria natural
Não traduziria o bem
Nem revelaria o mal
Não me queira ver falar de amor
Seja lá como for, dissimularia a dor
Não confessaria todos os pecados
Que por Deus já estão perdoados
Mas se algo eu lhe disser
Que soe como vier
Que não sejam versos meus
Já que é concebido por Deus
E que esteja em minha voz
Tudo que já habita em nós
Ciúme (Agostinho Fortes)
Tão devassador
Com tantas desmedidas
Meu amor assim chegou
E ancorou na minha vida
Remexeu o meu passado
Derramou a minha bebida
Humilhou-me um bocado
Trouxe à tona as feridas
Maldiz dos meus velhos namorados
Muito mais do que eu mesma poderia
Duvida do meu choro
Suspeita da minha alegria
Ele morre de ciúme do meu passado
Presente e futuro
Não sei mais o que lhe confesso
Nem sei mais o que lhe juro
Ah, se ele soubesse que se eu pudesse
Lhe entregaria as minhas preces
Meus segredos e meus sonhos
Como se fossem as minhas vestes
E assim talvez
Ele percebesse de uma vez
A minha alma desnuda
E viesse ao encontro meu
Suplicando por ajuda
Meu amor, coitado
Me ensina e me vê
Aprendendo a mentir
Aprendendo a viver
A voz do menino (Agostinho Fortes)
Às vezes a
gente desanda
E quer
desistir ou morrer A alma então se desarma
Deixando a dor se estender
Então vem a voz do menino
- Eu quero brincar com você !
Bola,
soldado, botão, pirraça
Peteca,
doce, cinema, praça E o sorriso do menino
Encheu meu peito de graça
A gente
rala à beça
Rebola, se
esfola e atola A gente faz muita promessa
Pra no fim do mês ver esmola
Então vem a voz do menino
- Papai, olha o que eu sei fazer !
Bola, soldado,
botão, pirraça
Peteca,
doce, cinema, praça E o sorriso do menino
Encheu meu peito de graça
Ninfeta (Agostinho Fortes)
Ela aparece cheia de graça
Cheia de tranças, de meia, pijama
Menina travessa, por que me chamas ?
Eu não dou trela, por mais que ela faça
Mas ela espera aquele segundo
Que os olhos vacilam e olham bem fundo
Ninfeta, não tenho sonhos pra ti
Tu nem suspeitas, mas já fui rapaz
Procura o teu sonho e me deixa em paz
Atiça, se esconde e se mostra
Alisa os seios e me vira as costas
Escapa dos braços, nas pernas me enrosca
Parece que brinca de me enlouquecer
É hora de criança dormir, já vai amanhecer !
É hora de criança dormir, já vai amanhecer !
Bate-bocas (Agostinho Fortes)
Deve ser bem melhor
Falar-te baixinho
Ao pé do ouvido
Bem devagarinho
Do que olhar-te de soslaio
E sair meio cambaio
Dos nossos bate-bocas
Deve ser bem melhor
Perder pra ti na discussão
Mas ganhar teu coração
Abrasar os teus lábios
E deixar a razão para os sábios
Que nada sabem de nós
Feliz ano novo (Agostinho Fortes)
Desejo-te
um feliz Ano Novo
Que
todo ano que venha, seja novo De novo, de novo e de novo
Desejo que dances uma valsa
Que andes descalça
Que ganhes um belo vestido
E quem sabe, um beijo atrevido
Que ao teu lado
Bata um coração comovido
De uma boa companhia
E que teu fado
Seja feito a poesia
De Vinícius, de Tom
De Chico ou Drummond
E
que se não veres graça
Em
mais um ano que passa Por favor, não chores
Pois mesmo que demore
O sol de um novo ano
Iluminando um novo plano
Há de brilhar pra ti
Ah,
quereria eu ser o larápio
Que
todo dia te traz brilhantes Em tuas mãos, pôr um cardápio
Com mil flores cativantes
Seria só escolheres uma
Que eu traria num instante
Ah,
quereria te furtar o Ano Velho
Ter
te conhecido um tempo antes Pra ver o bem que já te fiz
Estampado em teu semblante
E assim seguir ao lado teu
Pelo tempo que vai distante
Seu lugar (Agostinho Fortes)
Nenhuma mulher terá
seu cheiro
Um cheiro que só eu
sabia cheirar Nenhuma mulher terá seu jeito
Um jeito que só eu sabia ajeitar
Nenhuma mulher terá sua tez
Uma tez que só eu sabia corar
Nenhuma mulher me trará de volta a vida
Pois isto seria tomar seu lugar
Teu malandro (Agostinho Fortes)
Te cato
Me farto
Te largo
Tanto te maltrato
Que chego a cansar
Te faço de gato e
sapato
Te deixo um bagaço
Tens que suportar
Te nego
Me cego
Me calo
Te deixo de lado
Até cozinhar
Te boto no colo,
descolo
Teu corpo da alma
Pra que possas sonhar
Te quero prosternada
Ao meu lado, acanhada
E pedindo por mais
Sou o teu malandro
És a minha mulher
E vivemos em paz
E vivemos em paz
Cachaça com saudade (Agostinho Fortes)
Misturo
cachaça com saudade
Repouso
no colo o meu violãoSai uma poesia meio sem vontade
Lembrando os amigos e alguma paixão
Meu Deus, sei não
Sem tristeza não nasce a canção
Meu Deus, sei não
Sem dor não existe paixão
Será que a dor vem do Senhor
Ou veio antes de toda a vossa criação?
Até uma vida já nasce com dor
A mulher que o diga, dizei-me então!
Meu
Deus, sei não
Sem
tristeza é triste a canção Meu Deus, sei não
Sem dor não existe paixão
Teus olhos (Agostinho Fortes)
Se
soubesses como espero
Como
quero a tua atençãoNão chegavas tão exausto
Tão calado e tão sem razão
Se
soubesses como sofro
Por
viver assim sem fantasia Reparavas no vestido novo
No cabelo, na minha agonia
Sei
que andas com outras tantas
Torto
e morto de bar em bar Por saberes que sempre voltas
Pra quem sempre está a te esperar
Não
me faltam elogios
Que
na tua voz não são ditos Não me faltam olhos alheios
Mesmo os seus sendo os meus favoritos
E se,
às vezes, me desejas
Num
bravo impulso de amor Eu desato os cabelos
Perguntando-me se é por favor
E
depois da nossa cama
Sei
que tudo volta ao normal Vais reclamar da comida
Perguntar onde está o jornal
Eu
disfarço toda a dor
Tão
zelosa dos caprichos teus Só queria um instante
Dos teus olhos no fundo dos meus
Lá no fundo do fundo dos meus
Flores (Agostinho Fortes)
Na delicadeza de teus
movimentos, força
Na transparência de
teu olhar, mistério Perco-me em teus lábios cheios, encontro
No perfume da tua carne, a fragrância da tua alma
Quando perco-me entre
as ondas de nossos beijos, meu peito já não sinto
E neste beijo, sem
perceber, morro afogado, morro faminto Tempestuoso teu jeito, sereno teu íntimo
Tua pele é morena, teu vinho é tinto
Quando sinto teu
corpo, falta-me pensamento
Nas flores que te
deixo, não cabe o meu sentimento Seria necessária toda a primavera
Seriam necessárias pétalas ao vento
Diabo em conflito (Agostinho Fortes)
O diabo está em
conflito
Decidido a ser do bem
Acolheu o mais aflito
Salvou até um trem
O tinhoso também
rendeu
Muitas graças ao
Senhor
Fez promessa de
cultivar
A mais bela rosa do
amor
O capeta muito fez
Mas era larga a
estupidez
Viu o homem se
matando
Viu o homem, seu
freguês
Resolveu então
castigar
A humana insensatez
Fez miséria se
espalhar
Foi diabo outra vez
No fundo de todo mal
tem um bem
Que tem um mal também
E fica nesse vai e
vem
Que tem um mal que
tem um bem
Que tem um mal também
...
Fiz a sua mala (Agostinho Fortes)
Como era de costume,
fiz a sua mala
Não repare no volume,
não repare em nada Fiz caber no velho couro o seu grande reinado
Acredite, dessa vez está tudo acabado
Carregue as suas
costas frias e lanhadas
Pelas mãos das
meretrizes que não valem nada Leve seus beijos frouxos e de caridade
Meus dias infelizes, sua crueldade
Mas deixe o que
restou da minha vaidade
Que de tanto
maltratada esvaiu-se em lágrimas Darei para o primeiro que me der vontade
Pro segundo, pro terceiro, pra toda cidade
Alô maestro (Agostinho Fortes)
Alô
Maestro,
alôResponda por favor
Não quero nada demais
Nem um amor
Nem tirar sua paz
Quero só musicar
Uma letra qualquer
Como quem faz um bem
A uma bela mulher
À míngua de nota melhor
A letra está assim, muito só
Por favor, tenha dó
Veleiro (Agostinho Fortes)
Amor, nosso amor foi um
veleiro
Que muito navegou Por tantas tempestades
Por mais de mil cidades
Por tantos sonhos se embalou
Primeiro, era céu de brigadeiro
Que depois se acinzentou
A bombordo, muita flor
Estibordo, mais amor
Dos teus olhos o mar transbordou
Mas certa vez
O vento mudou Levando o mastro, a vela, o bom tempo e o amor
À deriva, em alto mar
Lembrei das besteiras que eu disse no altar
Mas o mau tempo insistiu
Foi difícil navegar
Por tantas tempestades
Por mais de mil cidades
Por tantos sonhos neste mar
Verdade que a gente bem
tentou
Nos pusemos a remar Por tantas tempestades
Por mais de mil cidades
É hora, amor, de retornar
Segunda-feira (Agostinho Fortes)
Segunda-feira chegou
Me fez da cama cair
A vida queima lá fora
E já me arde bem aqui
Segunda-feira empurrou
Meu corpo ladeira abaixo
A ladeira logo acabou
E meu corpo caiu num riacho
O corpo quis afundar
No arbusto ribeirinho, encalhar
Quis se perder nos afluentes
Se esconder feito os duendes
Mas a correnteza carregou
Levou meu corpo pra serpente
Então a pálpebra oscilou
E o sol tocou a lente
Vale transporte, crachá e pente
E identidade pra virar gente
Viro o café nem frio, nem quente
- Amor, tô indo pro batente
Segunda-feira lembrou
São seis bocas pra comer
E uma ainda na barriga
Que tá com medo de nascer
Então pulo da cama
Pulo no trem
Não faço drama
Pulo os trilhos da Central
Pulo até o carnaval
Pulo o pulo
Pulo a fogueira
Vou pulando sem hesitar
Que a vida não é brincadeira
Segunda-feira deixou
A segunda-feira morrer
Deito ao lado do meu amor
Pra ver segunda padecer
Menina linda (Agostinho Fortes)
Menina linda que tem
medo de amar
Permita-me que me
aproxime, me apresente Permita-me te conhecer, te revelar
Até quem sabe te surpreender e te casar
Há de ser bem devagar
Pois não pode o tenor
calar Perder a voz de açoite
Nem banda sair tocando
Assim, na calada da noite
Por isso deixa-me chegar
Como quem avista terra
A embarcação atracar
Hastear bandeira sem guerra
A tripulação pisar o chão
Como se beijasse a areia
Meu olhar te fustigar
Meu sangue ferver em tua veia
Quem sabe abres um sorriso
Um portão, um coração
Menina linda que tem
medo de amar
Permita-me te perder Mesmo antes de te ganhar
Mesmo antes de te esquecer
Lembrando dela (Agostinho Fortes)
Acordo já me lembrando
dela
E a manhã vem como um
palpite De que não existe Afrodite
De que não haverá apetite
De que não haverá calor
Por mais forte que raia o sol
Não haverá furor
Nem mesmo no futebol
Meu amor me levou
todos os amores
E eu que amava as
flores As cores, os odores
Amava o mar, amava o vento
Amava amar e o relento
Hoje acordo com um pássaro a cantar
E haja saco pra escutar
Já gritei pra vizinhança
- Vou matar a sabiá !
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